domingo, abril 22, 2007

Point of Departure


Regresso para registar a morte de um dos meus músicos preferidos. Adeus, Andrew Hill.

terça-feira, março 20, 2007

Penso Rápido

O blog deve ser como o arroz: soltinho.

Vou ali já venho.

quarta-feira, março 14, 2007

Bloc Party

Ainda sobre esta brincadeira. Será que o Daniel Oliveira alguma vez gozou com Santana Lopes, a propósito dos concertos para violino de Chopin?

terça-feira, março 13, 2007

Uma Família às Direitas

Bastam dois posts, um nostálgico e outro utópico, para ter a certeza de uma coisa: no próximo Verão Quente, vou ali ao Campo Grande buscar uns dvds.

segunda-feira, março 12, 2007

Mil palavras

Nick Tosches em busca das origens de uma das imagens mais famosas do mundo.

domingo, março 11, 2007

Jamo


A morte do jazz enquanto música progressiva e a sua putativa transformação em espectáculo de repertório tem sido uma ideia usada amiúde, entre os que entendem a evolução em música como um interminável quebrar de barreiras harmónicas, melódicas, rítmicas e cromáticas. Deste modo, apenas seria possível progredir musicalmente extremando a complexidade ou a simplicidade dos dois primeiros elementos ou alterando significativamente os vectores que enformam o segundo par. É uma visão redutora, embora não totalmente desprovida de méritos - uma boa regra para analisar as principais mudanças ocorridas na história da música, inadequada para compreender os seus últimos trinta anos de estraçalhamento não-narrativo. Particularmente inútil para entender a situação actual da música improvisada, presa entre avanços tecnológicos que permitam a utilização de forma simples, intuitiva e “orgânica” de instrumentos e mecanismos de produção e manipulação electrónica em tempo real.

Jason Moran, pianista culto e proficiente, tem uma obra atravessada por este problema e ainda não sabe como o resolver. Uma obra feita de remendos, aqui brilhante, ali frustrada com a época que atravessa. Noutras ainda, arrisco dizer, genial. O concerto do passado dia 6 no CCB representou bem essa encruzilhada. Tecnicamente melhor do que nunca e cada mais entrosado com os seus companheiros, Moran ainda foi bastante do que lhe conhecemos e distinguimos: um hermeneuta do gospel pós-Monk de acordo com Byard, Abrams, Hill e Nichols, versado em Schubert, Berg, James P. Johnson e Nino Rota.



No entanto, são agora mais claros os sinais de uma besta que já está em si desde o início – é só voltar a ouvir a notável discografia -, uma personalidade musical insatisfeita com os próprios constrangimentos do que se entende por música, pelo menos fora do circuito conceptual. Não é por acaso a referência à filósofa/artista Adrian Piper: o seu discurso é a base rítmica e tímbrica utilizada em “Artist Ought to Be Writing/Break Down” como forma de ultrapassar os condicionalismos da previsibilidade do que “não se deve fazer” e é sempre feito. Moran volta à ideia em “Ringing My Phone”, aqui utilizando o falar cantarolado informal de uma mulher turca. Ao nos abstrairmos dos sons que lhe dão origem, ficamos espantados pela diferença de resultados desta técnica.



Outras estranhas ocorrências: clusters na interpretação de “Body and Soul/Planet Rock”, uma espécie de gaguez sobre a melodia; “Arizona Landscape”, leitura straight de um belo tema para pianola de saloon; o bizarro – em Moran – cruzamento de Radiohead com The Bad Plus em “He Puts On His Coat and Leaves”, uma melodia harmonicamente simples repetida ininterruptamente, em crescendo e diminuendo.


Nasheet Waits, o baterista, é um espectáculo por si só. Músico de formidáveis recursos, à vontade entre o free e a soul, fã do “contrarritmo” (à falta de melhor palavra para definir “aquela” forma de polirritmia), é o companheiro ideal da visão universalista de Moran. Nem sempre entendo as contribuições de Tarus Mateen, o baixista, não sei se por uma questão de ignorância ou sentido estético. O seu papel não é de simples âncora rítmica - isso seria ultrapassado e desnecessário, dado o autêntico metrónomo que é a mão esquerda de Moran. Contudo, não se discerne a importância do seu papel, nem como solista, nem como segunda voz. Há momentos em que o som algo peculiar do seu baixo é até intrusivo.

Nem tudo resulta, nesta tentativa de abraçar métodos e ideias oriundos de outras artes performativas e conceptuais. Que isso não interessa, também sabemos. Resta-nos esperar que Moran se mantenha focado naquilo que deve explorar enquanto músico (algo a que pareceu dar importância quando falou) e não se deixe vogar por um “pan-estilismo” que pode impressionar, mas, necessariamente, não responde aos seus fantasmas.

A convite do Bodyspace. Foto de João Henriques.

sábado, março 10, 2007

Watchmen

Alan Moore / Dave Gibbons

domingo, março 04, 2007

Make 'Em Laugh

Donald O'Connor

sábado, março 03, 2007

Há Festa na Aldeia

O que têm em comum o governo e todos os partidos portugueses, a comissão de trabalhadores e a administração da PT, Fernando Rosas e Ricardo Salgado? Ninguém quer que o mercado funcione. Transcrevo Eduardo Pitta: «Pode ser que ainda hoje se saiba se somos um país evoluído, com regras de mercado, ou uma república das bananas, com cliques dinásticas.»
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A PT é uma empresa muito útil. Serve, no pior sentido da palavra, uma certa "aristocracia empresarial" lisboeta que vive dos ganhos obtidos pela sua proximidade do poder político. Normalmente, esta elite empresarial e as suas intenções passam despercebidos entre o jargão dos "jornais de negócios", todos muito domesticados. Desta vez, porém, foram bem visíveis as manobras de bastidores que levaram a este desfecho.

quarta-feira, fevereiro 28, 2007

Praça de Táxis

João Gonçalves apelida as recentes mudanças na gestão do tráfego em Lisboa de fascistas. Junte-se ao clube. Todavia, há uma dúvida que me assalta: vindo de quem vem, não será elogio?

terça-feira, fevereiro 27, 2007

Mamma Mia

Estive ontem a ver os "Diários de Motocicleta" (hagiografia light e bonitinha do jovem Guevara antes de brincar aos fuzilamentos) e uma coisa vos digo: se esta miúda me desse com os pés, também eu passava a preocupar-me com os pobrezinhos. Alguém estampou a cara errada na t-shirt.
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segunda-feira, fevereiro 26, 2007

Morricoroternsteinalamenti

Numa história aparentemente não relacionada com o Hattogate, o Daniel Oliveira - aquele senhor lá em cima, com óculos à Jean-Luc Godard - acaba de revelar que alguns temas anteriormente atribuídos a Elmer Bernstein, Nino Rota e Angelo Badalamenti são, afinal, da autoria de Ennio Morricone.
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Calma, povo. É só um teaser. Mais logo, se os ventos soprarem a favor, ainda vamos descobrir que Forest Whitaker e Hattie McDaniel são a mesma pessoa.

domingo, fevereiro 25, 2007

Mr. Weird

Wayne Shorter, responsável pelo melhor concerto de 2006.

sexta-feira, fevereiro 23, 2007

Remix Ensemble


Apresento-vos uma das poucas fotografias conhecidas de Joyce Hatto, pianista britânica, falecida no ano passado, com 77 anos, depois de uma longa luta contra o cancro. A Sra. Hatto retirou-se do circuito internacional de concertos em 1976, segundo o seu marido, manager e produtor, W. Barrington-Coupe, por recear que os ataques súbitos de dor provocados pela doença prejudicassem a qualidade da sua performance. Depois de alguns anos de silêncio, recomeçou a gravar num estúdio caseiro. Quando os discos começaram a sair, há alguns anos, na pequena editora do marido, as críticas foram tonitruantes. A simples vastidão e diversidade da obra interpretada (mais de cem discos, de Scarlatti a Messiaen), sempre com brilhantismo, não deixava dúvidas: Joyce Hatto era uma das melhores pianistas britânicas de sempre.

E assim foi, até há coisa de duas semanas, quando um jornalista musical resolveu ouvir um disco de Hatto no seu I-pod e este reconheceu a faixa, não como uma interpretação da inglesa, mas do pianista húngaro Laszlo Simon. O resto é arqueologia pós-moderna para audiófilos, uma modalidade de duvidoso futuro. Ashkenazy, Bronfman, Grante, Muraro, Collard, entre outros, passaram a ser, além de músicos reputados, pequenos heterónimos da genial fraude discográfica Hatto/Coupe. Nalguns casos – não todos -, as gravações originais foram alteradas, para parecerem mais rápidas ou mais lentas, o que certamente prolongará por algum tempo decifração completa da charada.

Nada de novo? Pois. É só que, às vezes, perco o interesse na espécie humana e encontro nestes exemplos algo de muito inspirador (e que raramente vejo na música erudita actual): a capacidade de criar. Não admira que os críticos tenham sido enganados.

terça-feira, fevereiro 20, 2007

Cinema Puro


Uma das mais belas, mais famosas e mais inúteis cenas da história do cinema é a do ataque do avião a Cary Grant no filme "North by Northwest." De certa forma, esta cena pode ser isolada do seu todo e exibida à parte, tal a sua autonomia em relação à história. A mera sucessão de imagens e sons, conjugados de determinada forma, independente do seu contexto, tem o poder estético da mais abstracta das artes: a música.
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Não há praticamente nada além de cinema puro em "Femme Fatale." Neste filme de Brian De Palma, como nos últimos filmes de David Lynch, pouco mais interessa que não seja a própria experiência sensorial provocada pela associação de imagens e sons, muitas vezes despidos de moral ou consequência. Se Lynch é um compositor de música de câmara, ampliando detalhes em cenas intimistas, De Palma é um sinfonista, foca pormenores em planos saturados de informação.
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A história, ou o que resta dela, gira, como a música ravel-hermmanniana de Sakamoto, à volta do corpo formidável de Rebecca (nome de filme de Hitchcock) Romijn. Aliás, as referências ao mestre inglês são abundantes: a duplicidade, as espirais, a obsessão metaforizada pela perseguição, o sonho, o voyeurismo, a queda, os meios que replicam ou amplificam a nossa visão como forma de particularizar determinado momento da acção. De Palma leva este jogo de referências intricado a outro nível através da auto-citação.

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É uma verdade velha como o mundo: o que interessa não é o que se conta, mas como se conta. Neste caso, não interessa sequer se se conta alguma coisa. "Femme Fatale" é uma homenagem à sétima arte em geométrica filigrana visual. Por uma vez, as meninas más merecem uma segunda oportunidade. Abençoado cinema.

sábado, fevereiro 17, 2007

The Moose



Woody Allen

quinta-feira, fevereiro 15, 2007

Um País em Saldos

Recebi um convite em casa. É de uma loja de fatos e casual wear para quem gosta do british countryside e recentemente comprou um BMW. Saloios, portanto. A linhas tantas, diz assim:
Contamos com a sua visita, para lhe dar-mos a conhecer as novidades desta estação.

Salvo erro, era o MEC que dizia que não faz muito sentido ser conservador num país com tão pouco que mereça ser conservado. Verdade. Mas isso - tal como este cartão afectado com a epígrafe The Spirit of Tradition - diz menos do país e mais dos que o conservam.
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Post em homenagem a João Fernandes Lavrador, navegador e explorador português.

segunda-feira, fevereiro 12, 2007

VPV

Pois eu sou de esquerda, Tiago, e nunca senti, sequer, o rabinho assado ao ler o nosso Vasco. Verdade seja dita, nunca sofri dos intestinos. Gosto de manga e de corn flakes. E aprecio particularmente quando Pulido Valente afirma - aos 40 minutos e 35 segundos deste programa -, a propósito do inimigo nº 1 da direita portuguesa, Mário Soares, que "o bom que o país tem agora é (principalmente) devido a ele" e que foi "um óptimo governante."
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Ainda que não sejam novidades, é sempre reconfortante ouvi-las da boca de São Vasco, o ídolo da direita que, dissimuladamente (ma non troppo), anda a ver se consegue entronizar o Marocas na categoria do Pior Português de Sempre. Mas adiante, que este blog não trata de técnicas de empalação.

Um Pequeno Abalo

Ontem.

domingo, fevereiro 11, 2007

Beim Schlafengehen



Beim Schlafengehen (Richard Strauss/Hermann Hesse)

Nun der Tag mich müd gemacht,
soll mein sehnliches Verlangen
freundlich die gestirnte Nacht
wie ein müdes Kind empfangen.

Hände, laßt von allem Tun,
Stirn, vergiß du alles Denken,
alle meine Sinne nun
wollen sich in Schlummer senken.

Und die Seele unbewacht
will in freien Flügen schweben,
um im Zauberkreis der Nacht
tief und tausendfach zu leben.

Por Claudio Abbado e Renée Fleming

sábado, fevereiro 10, 2007

César das Neves Descodificado


«The history of economic thought in the twentieth century is a bit like the history of Christianity in the sixteenth century. Until John Maynard Keynes published The General Theory of Employment, Interest, and Money in 1936, economics—at least in the English-speaking world—was completely dominated by free-market orthodoxy. Heresies would occasionally pop up, but they were always suppressed. Classical economics, wrote Keynes in 1936, "conquered England as completely as the Holy Inquisition conquered Spain.»

É assim que Paul Krugman inicia o seu artigo sobre Milton Friedman publicado na New York Review of Books. Vale a pena ler tudo.

O Erro de Pilatos

Se bem me lembro, aqui há uns anos, continuou tudo na mesma porque o povo jovem, moderno e muito hipócrita da capital resolveu ir para a praia sem passar pelas urnas. Se não vão lá pela ética da responsabilidade, eu digo de outra forma: tenham vergonha!

quarta-feira, fevereiro 07, 2007

domingo, fevereiro 04, 2007

Radar Khadafis

Aqui há tempos, o Prof. João Lobo Antunes referia duas éticas fundamentais na vida em democracia: a ética da liberdade e a ética da responsabilidade. Os portugueses, segundo Lobo Antunes, já assimilaram os princípios da primeira, mas estão ainda longe de assumir os deveres da segunda. Estou em total acordo.

Um dos aspectos da vida em sociedade onde mais se nota esta deficiência é a forma como nos comportamos nas estradas. Não me entendam mal, a minha posição relativamente a este assunto é bastante próxima da de Miguel Sousa Tavares: muitos acidentes resultam da má sinalização e construção das estradas e de um policiamento pouco pedagógico, mais preocupado em encher os bolsos do Estado do que propriamente a evitar que vidas se percam. Mas, sem escamotear a importância de qualquer um destes factores, é um facto que conduzimos de forma irresponsável.

O que não posso aceitar é que assumamos em definitivo essa irresponsabilidade e abdiquemos da nossa própria liberdade de fazer bem ou mal. Estou a falar, é claro, dos radares instalados pela Câmara Municipal de Lisboa em avenidas - a certas horas, parecem mais auto-estradas - que disparam automaticamente, sempre que um condutor ultrapassa o limite de velocidade. Ora, se disparam sempre e se, consequentemente, a multa vai sempre para casa, o infractor não tem qualquer hipótese de agir mal sem ser punido. Esta prática é, no meu entender, aterradora.

Dirão vocês que exagero, que se trata de mais um daqueles casos em que os fins justificam os meios. Não estou tão certo disso: com o inevitável progresso tecnológico, não tardará que esta ideia infernal da "punição automática" se aplique a outros aspectos da vida privada e em sociedade. Não há, também, câmaras de video em praticamente todas as artérias de qualquer metrópole? Será que falta assim tanto para que, por exemplo, as casas de cadastrados sejam controladas por olhos electrónicos, de forma a prevenir violência familiar e abusos sexuais de menores? Não existe já um chip que, implantado em crianças, permite aos pais controlar sempre a sua localização?

Já o disse aqui, os maiores ataques à nossa forma de viver virão de nós e da forma como, voluntariamente, escolheremos abdicar dos direitos e responsabilidades que nos competem.

Aborto VI - A Questão de Consciência

Tem sido dito, até dos dois lados em confronto, que o que está em causa é um problema de consciência. Oxalá fosse, mas não é. A questão da interrupção voluntária da gravidez, hoje e em Portugal, é um problema com dimensão política, porque de saúde pública. E é um problema de pobreza, incultura, menorização preconceituosa da mulher e medo. Nada disto faz com que a mulher que não pode (ou responsavelmente não quer) ser mãe aceite o filho indesejado. Tudo isto apenas a empurra para o aborto clandestino. A consciência tem o seu espaço de respiração na liberdade e na responsabilidade. Se o "sim" ganhar, então, de facto, levar por diante uma gravidez indesejada ou aceitar, livre e responsavelmente, dar vida passará a ser um problema de consciência.



Nuno Brederode Santos

quarta-feira, janeiro 31, 2007

Concertos comentados

Para quem nunca foi a um concerto na Gulbenkian e quer saber como é, deixo esta divertida amostra gravada secretamente pelo crítico Henrique Silveira.

segunda-feira, janeiro 29, 2007

Aborto V - O Professor Fedorento

Quem acha que é exagero, veja isto e leia isto.

Um livro wendersiano


"Avant la lettre", bem entendido. Se havia obra a pedir uma leitura cinematográfica de Wim Wenders, era esta e não Ripley's Game, sem qualquer menosprezo pelo belíssimo Der Amerikanische Freund.
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The Tremor of Forgery é um romance existencialista que descreve o quotidiano de um homem total(itaria)mente livre: a posição moral de Ingham é, no mínimo, manobrável e, para todos os efeitos, um sujeito sem raízes ou laços emocionais fortes. The Passenger também anda por ali, a forma de contar uma história enquanto ela desliza pelo segundo plano (ou sentido). Um profundo desprezo pela resolução. A vida é, afinal, uma longa sala de espera.

domingo, janeiro 28, 2007

Onde é que eu já li isto?

Todo aquele que escreve é um ladrão. Tiago Galvão é uma espécie de Arsène Lupin.

O post inevitável



Miles Davis, John Coltrane, Wynton Kelly, Paul Chambers e James Cobb.

quinta-feira, janeiro 25, 2007

Aborto IV - o exemplo do estrangeiro

Estados Unidos, Suécia, Noruega, Holanda, Reino Unido, Japão, Itália, Alemanha, Finlândia, Dinamarca, Canadá, Bélgica, França e Austrália. O que têm estes países em comum? Uma lei do aborto mais liberal do que a portuguesa.
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No entanto, boa parte da opinião de direita, sempre atenta aos estandartes do progresso e da civilização, esqueceu-se repentinamente de todos eles. Veja-se o preclaro Pereira Coutinho (uma desilusão pessoal). O inefável João Miranda. O impagável Dr. Espada. O Professor chanfrado. E muitos outros.

Aborto III - TV Marcelo

Parece que escolhi mal o vídeo. Corre por aí outro - sem link, por motivos de higiene - no qual o Professor chanfrado diz que as mulheres portuguesas vão passar a fazer abortos pelos seguintes motivos:

-Um incómodo momentâneo;
-Uma mudança de residência;
-Uma depressão ligeira;
-Um estado de alma inconstante.

terça-feira, janeiro 23, 2007

Aborto II - Uma Campanha Alegre

Por exemplo, Marcelo, jurista e acrobata circense nas horas vagas, é um dos que falam em "vida humana".

Apreciem os exercícios de contorcionismo que realiza para justificar o injustificável: o nosso Professor não abdica do aborto ilegal, inseguro e insalubre, com respectivas consequências penais. Porquê? Porque a lei que se prepara não contempla um Estado de dedo apontado, pronto a enxovalhar a mulher que aborta. Precioso.

Outro argumento, ausente desta pérola audiovisual, é desmontado pelo brilhante, são e lúcido Tiago Mendes, ex-Aforismos e Afins, no seu novo blog temático.

Aborto I - o argumento da "vida"

Se o embrião/feto se trata de uma vida humana ou, na versão sonsa, de "uma pessoa", a lei em vigor não pune o assassínio de deficientes e filhos de violadores. O Não precisa de rever a sua argumentação urgentemente de forma a resolver este contra-senso.

A Arte da Ilusão

Ainda a propósito do filme The Prestige, aqui ficam mais algumas notas da autoria de Jorge Palinhos.

Motto

«One must think like a hero to behave like a merely decent human being.»

May Sarton

domingo, janeiro 21, 2007

As vítimas da hipocrisia

Link obrigatório. Um post que diz mais do que eu alguma vez serei capaz de dizer sobre o meu voto no próximo referendo. Ainda assim, voltarei ao assunto.

A importância de ser livre

«No meu entender, a morte é o fim final, a eliminação total, da mesma forma que acredito que a Terra irá um dia deixar de existir, que o Universo vai deixar de existir, que o Cosmos desaparecerá da mesma forma, e no fim não vai haver nada de nada. E também creio que a vida é uma experiência sem sentido algum, triste e cheia de dor. Penso que a única coisa que nos resta fazer é descobrir a melhor maneira de viver e as melhores razões para nos mantermos vivos. A descoberta está nas escolhas morais que fazemos. O importante é não haver ilusões, porque, como sabemos, é muito mais fácil pensar que estamos a fazer as escolhas morais certas se acreditarmos que existe um paraíso e um inferno, ou se tivermos fé em Deus. Aí, acho que a vida é algo mais fácil. Vendemos a nós mesmos uma mercadoria moral, e é um encanto. Mas, sem essa bagagem, se mesmo assim formos capazes de fazer escolhas morais correctas, nesse momento essas mesmas escolhas ganham uma dignidade significante.»
Woody Allen, numa entrevista para o Expresso

sábado, janeiro 20, 2007

Café Expresso

A página de opinião dedicada a assuntos internacionais, por José Cutileiro e Miguel Monjardino, é do melhor que se faz nesta paróquia. Ideias claras, concisas e informativas.

quinta-feira, janeiro 18, 2007

Ossessione

Jessica Biel

Litost

«Litost é uma palavra checa intraduzível noutras línguas. A primeira sílaba, que se pronuncia longa e acentuada, faz lembrar o queixume de um cão abandonado. Para o significado da palavra, procuro inutilmente um equivalente noutras línguas, se bem que dificilmente conceba que seja possível compreender a alma humana sem ela.
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Vou dar um exemplo: o estudante tomava banho com sua amiga, também estudante, no rio. A moça era desportista, mas ele, ele nadava muito mal. Não sabia respirar debaixo de água, nadava lentamente, a cabeça nervosamente erguida acima da superfície. A estudante estava perdidamente apaixonada por ele e era de tal forma delicada que nadava quase tão devagar quanto ele. Mas como o horário de banho estava quase a acabar, ela quis dar por um instante livre curso a seu instinto desportivo e dirigiu-se, num crawl rápido, para a margem oposta. O estudante fez um esforço para nadar mais depressa, mas engoliu água. Sentiu-se diminuído, desnudado na sua inferioridade física, e sentiu a litost. Lembrou-se de sua infância doentia, sem exercícios físicos e sem amigos, sob o olhar excessivamente afetuoso da mãe e desesperou de si próprio e da sua vida. Ao regressarem por uma vereda, iam silenciosos. Ferido e humilhado, sentia um irresistível desejo de bater nela. "O que é que te deu?", perguntou ela, e ele censurou-a: ela sabia muito bem que havia corrente perto da outra margem, tinha-a proibido de nadar daquele lado porque se arriscava a afogar-se e deu-lhe uma bofetada. A moça começou a chorar e ele, ao ver as lágrimas sobre o rosto, sentiu-se cheio de compaixão por ela, tomou-a nos braços e sua litost dissipou-se.
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Ou então um outro acontecimento da infância do estudante: os pais obrigaram-no a ter lições de violino. Ele não era muito dotado e o professor interrompia-o com uma voz fria e insuportável, apontando-lhe os erros. Sentia-se humilhado e tinha vontade de chorar. Mas, em vez de tentar tocar melhor e sem erros, enganava-se deliberadamente, a voz do professor ficava ainda mais insuportável e dura, e ele mergulhava cada vez mais na sua litost.
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Então o que é a litost? A litost é um estado tormentoso que nasce do espectáculo de nossa própria miséria repentinamente descoberta.
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Entre os remédios habituais contra nossa própria miséria, há o amor. Porque aquele que é amado de maneira absoluta não pode ser miserável. Todas as fraquezas são resgatadas pelo olhar mágico do amor, em que até a natação desajeitada, com a cabeça erguida acima da superfície da água, se pode tornar encantadora.
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O absoluto do amor é na realidade um desejo de identificação absoluta: é preciso que a mulher que amamos nade tão lentamente quanto nós, é preciso que ela não tenha um passado que só a ela pertença e do qual possua recordações felizes. Mas quando a ilusão da identidade absoluta se quebra (a jovem recorda-se com alegria de seu passado ou então nada depressa), o amor torna-se uma fonte permanente do grande tormento que chamamos litost.
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Quem possui uma experiência profunda da comum imperfeição do homem está relativamente a salvo dos choques da litost. O espetáculo de sua própria miséria torna-se-lhe uma coisa banal e sem interesse. A litost é, portanto, um traço sintomático de inexperiência. É um dos adornos da juventude

Milan Kundera, O Livro do Riso e do Esquecimento

quarta-feira, janeiro 17, 2007

Hoje acordei assim,

com um marcador de livro na boca.

domingo, janeiro 14, 2007

Alice do outro lado do espelho

Alice Coltrane, 1937-2007

Resolver o problema iraquiano em quinze linhas

Parece absurdo. E é. Contudo, lembra o Daniel Oliveira, há candidatos americanos à presidência apostados em resolvê-lo numa frase, curta em palavras, longa em irresponsabilidade. Mas não há só um Lado A e um Lado B da mesma cassete. De acordo com este artigo da New Yorker, a política externa parece ser um assunto que divide os candidatos democratas (putativos e assumidos).
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Os Estados Unidos destruíram um estado pobre, iníquo e sem liberdade. Ainda assim, um estado. É sua obrigação deixá-lo com um mínimo de sustentabilidade. Devem-no aos iraquianos, por razões óbvias, e ao mundo, mais perigoso com o desequilíbrio de forças regional no Médio Oriente.
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No entanto, a postura responsável sobre a questão iraquiana colide com a longa campanha eleitoral para as presidenciais. Ironia cruel: a desastrosa ideia de invadir o Iraque manteve Bush na Casa Branca mas, agora, que a permanência das tropas no país é mais importante do que nunca, o discurso popular é o do abandono.

sexta-feira, janeiro 12, 2007

Santa paciência

Proponho a canonização imediata de Carlos Abreu Amorim e Eduardo Nogueira Pinto, pelo cavalheirismo demonstrado nas réplicas aos mais torpes argumentos.

quinta-feira, janeiro 11, 2007

Alhambra

Pátio dos Leões

terça-feira, janeiro 09, 2007

Tricky Dick*

Morreu em solidão, no quarto de um hotel em Paris, com 24 anos, vítima de uma overdose de heroína.
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Quantas vezes ouvimos a história no folclore do jazz? Demasiadas. É uma morte quase vulgar entre os seus intérpretes, sobretudo durante os anos 50 e 60. Mas este talento excepcional não merece ser desvalorizado como um mero interesse para aficionados. As suas composições revelam um criador de música impudente, livre e humorada. Que as (raras) gravações da música de Dick Twardzik sejam ouvidas até à última nota, com a máxima atenção.

Gravado na casa Van Gelder, a 27 de Outubro de 1954.
Albuquerque Social Swim
A Crutch for the Crab

*agradeço o título a estes
amigos.

domingo, janeiro 07, 2007

O dilema do homem livre

Até que ponto devemos sacrificar os nossos valores quando o que está em causa é a sua própria sobrevivência? Não vou fazer analogias entre esta cena de "Life and Death of Colonel Blimp" (filme a certos títulos seminal, a outros estéril) e o presente estado das coisas: o assunto é demasiado grave para brincarmos às diferenças. Julgo, aliás, que os maiores ataques à nossa forma de viver virão de nós e da forma como, voluntariamente, escolheremos abdicar dos direitos e responsabilidades que nos competem.
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Mas divago. Voltemos à obra-prima de Powell e Pressburger, aqui interpretada por Anton Walbrook (o alemão Theodor Kretschmar-Schuldorff) e Roger Livesey (no papel do oficial britânico Clive Candy).

Como sabemos, a História seguiu o caminho de Kretschmar-Schuldorff - Dresden, Hiroshima, Nagasaki, etc. Os fins justificam os meios? Tal como Clive Candy, inclino-me sempre para rejeitar esta máxima. E, no entanto, a resposta racional parece ser "depende dos fins." Esta é a ambiguidade sangrenta que nos acossa.

sábado, janeiro 06, 2007

Vespere promittunt multi quod mane recusant

Um disco de Mal Waldron, um monólogo de Jay Leno, um post desnecessário no blog, uma crónica de Pereira Coutinho, um filme de Ingmar Bergman. Lá se foi o "exercício físico matinal."

Os Filmes de 2006

Devo estar a ficar velho. Boa parte dos meus filmes preferidos deste ano foram realizados por artistas que já se podem considerar clássicos, ainda que continuem a fazer cinema diferente e marcadamente seu. Estou a falar de Spielberg, paradoxalmente, mais depurado e complexo, de Spike Lee, autor de uma encomenda tão deliciosa quanto inesperada, de Scorsese, regressado a território familiar após dois filmes menos conseguidos, de Woody Allen, finalmente a sacudir o torpor artístico dos últimos anos, de Michael Mann, autor da melhor poesia visual para multiplexes, e, sobretudo, de Cronenberg, cujo filme se devia intitular "A Theory of Everything."
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Resta pouco: a bravíssima tentativa (nem sempre conseguida) do argumentista/realizador de Syriana de tratar o tema do petróleo da forma que merece; a dor surda que me deu ver "Ninguém Sabe", o filme de Koreeda.
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Ou o prazer de ver outro clássico, Mallick, naquela forma de filmar que, tal como a de John Ford, nos parece a única possível. O belíssimo "Marie Antoinette", de Sofia Coppola, parece usar a mesma gramática e deixou-me igualmente apaixonado.

sexta-feira, janeiro 05, 2007

Só está bem a dizer mal

Escrevo melhor quando tenho uma opinião negativa da matéria em causa. Espero mudar em 2007, mas não prometo.

quarta-feira, janeiro 03, 2007

Pormenores significantes

A história é simples. Na semana passada, o Ministério da Saúde enviou uma circular recomendando a adopção de sistemas electrónicos de controlo de assiduidade. Medida lógica, transparente e, arrisco dizer, saudável? Não, uma decisão «lamentável, imprópria e populista.» É assim que a define o inefável bastonário da Ordem dos Médicos, para, logo a seguir, descrever, sem sombra de populismo, o centro da questão: os hospitais vão ser «obrigados a comprar relógios quando muitas vezes não têm verba para adquirir medicamentos.»
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E, como o ridículo e o despudor não matam, o excelentíssimo bastonário larga ainda outra pérola surrealista: «É uma medida que ofende os médicos», até porque, como é do conhecimento popular, «se um elemento da equipa chegar atrasado, acaba por ser banido pelos restantes colegas.» Que levante o dedo quem nunca viu um médico votado ao ostracismo, longe do seu ninho corporativo, por esta ou outras razões!
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Já o colega dos enfermeiros, Sr. José Azevedo, é apologista de um humor mais contido. Considera a medida um «gasto inútil e desnecessário», salientando que a «assinatura da pessoa é o documento mais fiável». De acordo, é fiável. Fiável e intemporal. Por exemplo, eu assino hoje como assinava há um mês. Num livro de ponto. Por exemplo.