domingo, dezembro 31, 2006

Bom 2007


Para as festas de fim de ano, sugiro o grande disco de Justin Timberlake, talvez o que mais ouvi em 2006.

The Prestige

Deixei a citação do post anterior a propósito do filme de Christopher Nolan que estreou recentemente. Os temas são familiares: a rivalidade artística, a obsessão, o sacrifício pela beleza e pela imortalidade. As suas falhas também: um final algo pífio, como agora é comum usar-se, e as personagens femininas. Nesse aspecto - que me perdoe Scarlett e a sua sensualidade intermitente -, estávamos mais bem servidos pela fabulosa Jessica Biel no outro filme deste ano sobre ilusionismo no final do século XIX.

Há, contudo, diversas opções que importa elogiar. Como a saudável recusa em defender uma personagem por contraponto a outra, nesta luta de dois seres desfigurados pela sua incessante busca da perfeição. Ou a presença de David Bowie, figura tão respeitável quanto acabada (musicalmente falando), que aqui assina um regresso em grande estilo ao cinema, encarnando o excêntrico e genial Nikola Tesla, alguém que também sabia uma coisa ou duas sobre a rivalidade e a obsessão.

Mas este filme vale sobretudo por Angier, a personagem defendida com brio por Hugh Jackman, ilusionista talentoso com origens renegadas na aristocracia britânica. Pelas críticas que tinha lido antes de ver o filme, concluí que se tratava de um excelente mestre-de-cerimónias, apenas preocupado com a aparência do espectáculo. Nada mais errado. Angier vive amargurado por não ter o talento inato de Braddon (Christian Bale), seu rival. E, de forma secundária, inveja também a vida pessoal que este leva (e lhe tirou). Mas, mesmo nas alturas de maior sucesso profissional, o seu maior desejo é saber o segredo de um truque do seu colega, o qual ele não consegue desvendar.

A história do filme é a história dessa obsessão, da subversão dos valores aceites, da rejeição do banal, tudo em busca da perfeição. A arte obriga-nos a sujar as mãos, alguém diz. Quem não o faz, nunca será um artista completo.

A Arte e a Moral

The West's greatest writers are subversive of all values, both ours and their own. Scholars who urge us to find the source of our morality and our politics in Plato, or in Isaiah, are out of touch with the social reality in which we live. If we read the Western Canon in order to form our social, political, or personal moral values, I firmly believe we will become monsters of selfishness and exploitation. To read in the service of any ideology is not, in my judgment, to read at all. The reception of aesthetic power enables us to learn how to talk to ourselves and how to endure ourselves. The true use of Shakespeare or of Cervantes, of Homer or of Dante, of Chaucer or of Rabelais, is to augment one’s own growing inner self. Reading deeply in the Canon will not make one a better or a worse person, a more useful or more harmful citizen. The mind’s dialogue with itself is not primarily a social reality. All that the Western Canon can bring one is the proper use of one’s own solitude, that solitude whose final form is one’s confrontation with one’s own mortality.

Harold Bloom, The Western Canon

quinta-feira, dezembro 28, 2006

Plano Picado

Uma experiência: observo por largos minutos o movimento de pessoas nas escadas rolantes do Colombo. Não há um Cesário que descreva isto?

quarta-feira, dezembro 27, 2006

O Preço Certo

Ainda a propósito desta conversa, vale a pena regressar ao post final. Cito: «Jason Moran, Jeff Ballard, and Joe Martin all selected The Price is Right for a TV theme, which seems a bit bland until you see Jason's cryptic note, "bass line."» Sinto-me, finalmente, compensado das mais torpes injúrias a que fui submetido por aconselhar esta música aos melhores ouvidos de Portugal. Oiçam, senhoras e senhores, esta "valsa do minuto" dos tempos modernos! Ó Deus misericordioso, que nos criaste à tua imagem: haverá alguma parte do teu omnipresente rabinho que não abane ao som desta pérola funk-pop para supermercado de Miratejo? Se dúvidas ainda restam, aqui ficam as provas. Primeiro ao vivo e a cores, depois para sacanço, livre dos Fernandos Mendes deste mundo.



Tema d'"O Preço Certo"

terça-feira, dezembro 26, 2006

Mulheres de barba rija

Lista, sem ordem particular, de escritoras-ficcionistas/poetisas cujas obras (ou pelo menos uma) considero importantes. Para o meu amigo Pedro Gomes, que diz que eu só leio escritores de barba rija:

Sylvia Plath
Anna Akhmatova
Virginia Woolf
Charlotte Brontë
Anne Brontë
Emily Brontë
Clarice Lispector
Iris Murdoch
Katherine Anne Porter
Nathalie Sarraute
Mary Shelley
Ruth Rendell
Gertrude Stein
P. D. James
Susan Sontag
Patrícia Highsmith
Carson McCullers
Flannery O’Connor
Marguerite Yourcenar
Jane Austen
Edith Wharton
Colette
George Eliot
Emily Dickinson
Maya Angelou
Barbara Pym
Selma Lagerlöf
Nadine Gordimer
Harper Lee
Sophia de Mello Breyner Andresen
Ana Teresa Pereira

sábado, dezembro 23, 2006

Um dia sem gravidade

Isaac Newton, provavelmente o homem mais importante nascido a 25 de Dezembro, numa fotografia de Eduardo Gageiro.
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Até segunda-feira!

quinta-feira, dezembro 21, 2006

Non-denial denial

Para quem não conhece esta expressão celebrizada pelo escândalo Watergate, aqui deixo um exemplo tosco.

quarta-feira, dezembro 20, 2006

Snobismos

Axelrod, David. Snob-exhumed purveyor of 1960s orchestral funk. A West Coast producer-arranger with a C.V. worthy of a James Ellroy character—as a young man he dabbled in violent crime, and went on to become a jazz producer in the 50s—Axelrod established himself in the mid-60s producing artists as varied as Lou Rawls and the Electric Prunes, and under his own name recorded ambitious, layered albums that defied categorization. (He once used Blake poems as lyrics.) A commercial failure in his own era, Axelrod embarked on a cocaine-fueled downward spiral, but fortune smiled upon him in the 1990s when the likes of Lauryn Hill, Dr. Dre, and DJ Shadow sampled his work.

Second-unit director. A deputy to a film’s main director whose job is to shoot scenes and footage that don’t require the presence and immediate supervision of the main director, often action sequences and expositional location shots. Many a second-unit director, having overseen his own semi-autonomous production crew, has eventually graduated to supremo-director status, though Snobs glory in knowing the names of such career second-unit specialists as Yakima Canutt (who was also an ace stuntman in John Wayne movies) and B. Reeves Eason. No disrespect to Paul Verhoeven, but the real reason RoboCop rocks is that Monte Hellman was the uncredited second-unit director.


Desavergonhadamente copiado daqui para Cool R.

terça-feira, dezembro 19, 2006

My Kind of Gal



Gene Tierney

segunda-feira, dezembro 18, 2006

Germanofilia

Não entendo as pessoas que não gostam de alemão. Ontem à noite, enquanto ouvia o prólogo do ciclo “Die Schöne Müllerin”, pensei que era capaz de ouvir vezes sem conta os poemas de Wilhelm Müller, simplesmente pelo prazer de ouvir a língua germânica tão bem tratada na voz ímpar de Dietrich Fischer-Dieskau.

Como é possível preferir o pragmatismo básico do inglês, fechado e isolado na Grã-Bretanha ou articulado com ingenuidade boçal (ainda que simpática) pelos americanos? Ou o francês, essa lengalenga efeminada - pardon my french - cujo futuro será servir de língua franca em boutiques, cabeleireiros e outras reservas naturais? Ou o italiano (fantástico sim, para quem gosta de amanhar peixe)? Ou até o castelhano (uma espécie de feira de Carcavelos de boca em boca que, em sussurro, me lembra os beijos apressados de uma companheira imaginária que insiste em limpar o nosso esófago com a língua)?

Não, nunca! Além da beleza da sua complexidade estrutural (as declinações, as palavras compostas, a dicção), o alemão carrega um lastro nas palavras que rasga profundidade em cada momento inesperado do quotidiano. É uma língua expressiva, sem ser espalhafatosa. Liga com o silêncio, com os sons da natureza e… com a maravilhosa música de Schubert.

Incorrigível

What is your favorite occupation?

One always returns to writing. I resist the temptation to say that good fucking is really my favorite. One is now too old to talk like that.


Norman Mailer para João Bonifácio.

Wow!



Nunca fui um grande adepto da música de Oscar Peterson, que por vezes cai num virtuosismo fátuo pour épater le bourgeois. Talvez seja também o caso deste delírio boogie para dezassete mãos, mas a verdade é que não consigo deixar de ficar empolgado!

domingo, dezembro 17, 2006

O caso Rogeiro

1. Nuno Rogeiro aceitou um convite do Ministério dos Negócios Estrangeiros do Irão, uma ditadura teocrática, para participar numa «fact finding mission» que o próprio, na sua propalada tendência para o secretismo, não esclarece convenientemente.

2. Atribuindo um revigorado sentido à expressão "idiota útil", o nosso Nuno escolhe fazer a missão durante o período do simpático concílio dedicado à negação do Holocausto, e, por motivos que me ultrapassam, resolve participar, amolgado - segundo o próprio - entre «nazis e racistas (incluindo David Duke, ex-"Grande Dragão" do Ku Klux Klan), elementos da extrema-esquerda "anti-ianque" europeia e japonesa» e Ahmadinejad himself, o anfitrião (da conferência e de Rogeiro), para afirmar o óbvio. Diz ele, uns dias mais tarde, que "nem o patético venezuelano Chavéz, nem o eterno moribundo Castro, se atreveram a solidarizar-se com a cretinocracia de Teerão". Pois.

3. Segundo o próprio, antes e depois da conferência, Rogeiro vive «na clandestinidade» e o governo iraniano não sabe dele. Não sem alguma vaidade, reconhece que se safou muito bem («outras guerras»). Recordo: era uma missão a convite do governo iraniano (presumo que com viagem incluída no pacote).

4. Zangado com a falta de espírito democrático dos participantes e dos organizadores do conclave, Rogeiro chega a Portugal e lança o seu último bafo de cretinice: «É preciso dar ao Irão um tempo razoável para pedir desculpa pelo que se passou. É preciso dar ao Irão um tempo razoável (mas não muito), para identificar publicamente aqueles que falaram em Teerão, e o que disseram sobre o Holocausto. (...) Se nada acontecer, a UE deveria suspender toda e qualquer relação com o Teerão.» Recordo que Rogeiro - sempre um original na utilização criativa da língua portuguesa - tinha redefinindo o conceito de eufemismo, já em Teerão, ao dizer à RCP que "nem tudo funciona bem" no Irão.

Será que eu percebi bem a história?

To Whom It May Concern

Vi caixas da Colecção Ingmar Bergman à venda, por €30 cada, no centro comercial espanhol mais conhecido de Lisboa. Uma média de €5 por obra-prima. Não me ocorre melhor prenda de Natal. Bom, talvez uma loção para o corpo da Chanel por €60, mas tirando isso não estou a ver mesmo nada.

sábado, dezembro 16, 2006

Um Bond desconhecido

'It's all very fine,' said Bond, 'but I've been thinking about these things and I'm wondering whose side I ought to be on. I'm getting very sorry for the Devil and his disciples such as the good Le Chiffre. The Devil has a rotten time and I always like to be on the side of the underdog. We don't give the poor chap a chance. There's a Good Book about goodness and how to be good and so forth, but there's no Evil Book about evil and how to be bad. The Devil has no prophets to write his Ten Commandments and no team of authors to write his biography. His case has gone completely by default. We know nothing about him but a lot of fairy stories from our parents and schoolmasters. He has no book from which we can learn the nature of evil in all its forms, with parables about evil people, proverbs about evil people, folk-lore about evil people. All we have is the living example of the people who are least good, or our own intuition.

'So,' continued Bond, warming to his argument, 'Le Chiffre was serving a wonderful purpose, a really vital purpose, perhaps the best and highest purpose of all. By his evil existence, which foolishly I have helped to destroy, he was creating a norm of badness by which, and by which alone, an opposite norm of goodness could exist. We were privileged, in our short knowledge of him, to see and estimate his wickedness and we emerge from the acquaintanceship better and more virtuous men.'

Ian Fleming escreveu estas palavras em Casino Royale, na boca de um espião que, durante toda a aventura, não usa gadgets nem por uma vez dispara a sua arma. A recente versão para cinema é um passo de gigante em relação à personagem de BD que Brosnan vinha encarnando, mas está ainda longe deste animal seco, bizarro, quase medieval, com um sentido do dever extremado de origens pouco claras e uma visão (ainda mais) obtusa das mulheres. É um livro distante, quase esquemático, coberto por uma pátina que lhe dá um interesse lateral como "curiosidade". Ainda assim, muito melhor do que eu esperava.

quarta-feira, dezembro 13, 2006

Discutir o plágio, agora a sério

É o que faz Eugene Volokh, a propósito de uma acusação contra Ian McEwan publicada no Daily Mail. Deste escritor britânico conheço apenas "Amesterdão", um livro que já esteve mais longe das Escadinhas do Duque.

terça-feira, dezembro 12, 2006

Do Mal o Mais


Gigante subvalorizado do jazz. Não preciso de palavras, apenas Mal.

domingo, dezembro 10, 2006

Les (Bond) Girls

A propósito desta conversa, e como estou a escrever para mim, sinto-me livre para fazer uma confissão embaraçosa. Devo a uma Bond Girl a minha primeira excitação sexual. A feliz contemplada, Caroline Munro - hoje um muito obscuro objecto de desejo -, já na altura não era enquadrável nos meus (nem sempre) exigentes padrões de beleza. Estão lá as medidas olímpicas, é certo, mas a mulher aparece em praticamente todas as fotografias da época coberta pelos pós e tintas de um maquilhador excessivamente zeloso, devoto da pintura de Jackson Pollock.
Seja como for, a imagem de Caroline aos comandos de um helicóptero destruidor, piscando o olho a Bond enquanto se prepara para disparar mais um rocket na sua direcção ficou eternamente gravada na minha memória. Pensando bem, a sua leitura não é assim tão linear e até permite um ensaiozito de algumas páginas. Abençoada sejas, Caroline, por nos dares tanto que... pensar.

Outras referências: o corpanzil de Ursula Andress a sair da água; a angústia papel maché de Claudine Auger; o regresso aos helicópteros, com a muito mais bela Corrine Clery.

PS: Eva Green está deslumbrante nalguns momentos de Casino Royale.

Metabloguismo (começa cedo)

Ainda ninguém sabe do blog. O que faz deste um post datado.

Da minha aldeia vejo quanto da terra se pode ver do universo

No alfarrabista das Amoreiras.

Mãe, quem é o Abraão?
Anda...
Quem é, mãe?
Monte Abraão é lá ao pé do Cacém.

terça-feira, dezembro 05, 2006

Do Mal o Menos

The Bad Plus é o nome de uma banda de rapazes hiperactivos e de algum mau gosto, com um blog muito interessante. Têm vindo a fazer uma espécie de questionário de Verão natalício a alguns músicos, entre eles os monumentais Brad Mehldau e Jason Moran. Vale a pena ler, para procurarmos as peças que não conhecemos e regozijarmo-nos com as escolhas estranhas que acertam mesmo no nosso gosto peculiar: Moran escolhe a música do Preço Certo e Reid Anderson elogia a melodia do primeiro andamento do concerto para violino de Barber.

Ficam as minhas respostas, com a devida vénia aos autores:

GIVE US AN EXAMPLE OR TWO OF AN ESPECIALLY GOOD OR INTERESTING:
1. Movie score. Bram Stoker's Dracula (Wojciech Kilar)
2. TV theme. Moonlighting (Al Jarreau)
3. Melody. Love Theme "The Thief of Baghdad" (Miklos Rozsa)
4. Harmonic language. Images (Debussy)
5. Rhythmic feel. Water No Get Enemy (de Fela Kuti, com Tony Allen na bateria)
6. Hip-hop track. They Don't Wanna Fuck With Me (Missy Elliott/Timbaland)
7. Classical piece. Postlude (Lutoslawski)
8. Smash hit. Deja Vu (Beyonce & Jay Z, produção de Rodney Jerkins)
9. Jazz album. Witness (Dave Douglas)
10. Non-American folkloric group. Taraful Haiducilor
11. Book on music. Nenhum em particular.
BONUS QUESTIONS:
A) Name a surprising album (or albums) you loved when you were developing as a musician [neste caso, ouvinte]: something that really informs your sound but that we would never guess in a million years: Vulgar Display of Power (Pantera)
B) Name a practitioner (or a few) [...] that you think is underrated: Steve Coleman, Ben Allison, Vijay Iyer.
C) Name a rock or pop album that you wish had been a smash commercial hit (but wasn’t, not really): Blur “13”
D) Name a favorite drummer, and an album to hear why you love that drummer: Nasheet Waits - Andrew Hill “A Beautiful Day”

domingo, dezembro 03, 2006

Gory Humour

Do you know if President Bush has seen the movie yet?

Well, he claimed that would not see it. That’s why I wrote the book. He’s a reader.

Al Gore